Talvez nos dias de hoje se tenha perdido a noção do ridículo e, fundamentalmente, do bom senso, vejam-se por exemplo os gastos astronómicos, autênticas fortunas, unicamente para, por exemplo, aumentar audiências televisivas. Já vale quase tudo. A este respeito, quando a caixa de Pandora se abriu em Portugal com o aparecimento do “Big Brother” poucos acreditariam que se chegasse ao ponto a que se chegou neste momento, desde pessoas a testarem os seus limites físicos e psicológicos, a lutarem por posições empresariais, por empregos ou a fazerem os maiores disparates pondo, muitas das vezes as próprias vidas em perigo. Só em Portugal já passaram uma boa quantidade de reality shows. Recorri à internet e destaco, naturalmente, o já mencionado “Big Brother”, o “Masterplan”, Survivor”, “Quinta dos Famosos”, “Acorrentados”, “Bar da TV”, “Confiança Cega”, “Peso Pesado”, “Ilha da Tentação”, “Casa dos Segredos”, “Supernanny”, “Masterchef”, “Love on Top”, “Casamentos à Primeira Vista” ou “Pesadelo na Cozinha”, entre outros. Nos Estados Unidos então são para cima de duzentos, o “Shark Tank”, “Face Off”, “The Apprentice”, “Jackass”, “Botched”… enfim uma panóplia de programas disparatados que pululam nas nossas televisões e que continuam, infelizmente, a cultivar a ignorância nos nossos jovens, fazendo crer que a vida é da forma como nos fazem crer que é sem sequer se ter o cuidado de efectuar o trabalho de desconstrução da falsa realidade. As pessoas consomem o que lhes apresentam e infelizmente a maioria não consegue perceber que não vivemos num mundo superficial, a realidade é muito mais cruel do que a que nos apresentam. Ainda assim os reality shows de cariz musical ou os de artes culinárias serão, no meu entender, os mais lúdicos. Se alguns provocam em nós o espírito empreendedor, outros mais não são do que autênticas aberrações tal a falta de educação e ética. Muitos destes programas são anteriores ao “boom” das redes sociais (que já não é assim tão grande) mas é minha convicção que com o exponencial crescimento destas os próprios reality shows se conseguiram adaptar, para o bem e para o mal. Existe, quanto a mim, um elo de ligação comum a todos estes programas, esse elo chama-se exploração de sentimentos, hoje em dia recorre-se a esta exploração sem haver preocupação com o indivíduo, com o que pode suceder a seguir, com as consequências dessa mesma exploração. Perdeu-se a noção de humanidade e sobriedade, parece que se vive ébrio na ânsia de se mostrar ao mundo algo que devia ser pessoal, particular. As redes sociais têm muita força no que a, também, este assunto diz respeito, a sua influência é enorme. Vejamos outro exemplo, aquele que se passou com as eleições presidenciais norte americanas de 2016 ou mais recentemente com as eleições no Brasil onde o recém empossado presidente fez grande parte da sua campanha eleitoral praticamente sem sair de casa recorrendo, para o efeito, precisamente às redes sociais. Isto só para focar a sua influência no plano político porque na vida das pessoas, a mesma revela-se gigantesca, quer seja positiva ou negativamente. Na realidade a utilização das redes sociais tem algumas vantagens, desde logo a comunicação mais fácil e rápida entre as pessoas, o acesso à informação, a partilha de ideias e ideais, imagens, momentos, o reencontro com pessoas que, por imperativos da vida de cada um, deixaram de se encontrar ou se ver. Quantas vezes não vimos ou ouvimos já dizer que alguém encontrou no Facebook ou no Instagram um colega ou amigo de escola do qual não sabia há anos? Haverá poucas pessoas a quem isso não tenha acontecido.
Cada vez mais penso que a forma como concebo a utilização das redes sociais não se coaduna com os dias estranhos (muito estranhos!!) em que o mundo vive. Para mim as redes sociais servem para a diversão, para o sorriso, para o conhecimento, para a alegria, de forma a conseguir equilibradamente partilhar aquilo que quero com quem quero mas sempre “na desportiva”… isso de destilar veneno não é para mim.
Na realidade todo o mundo da
Internet alterou o outro mundo, aquele que nós, das gerações de 60, 70, 80 do século XX conhecíamos. O mundo evoluiu, é certo, mas não quer dizer que tenha evoluído de forma totalmente positiva. Quanto a mim, com o decorrer dos anos, foi-se perdendo o essencial e imprescindível equilíbrio tão necessário a toda e qualquer acção das nossas vidas. O radicalismo em muitos aspectos da sociedade tem ganho terreno de forma muito preocupante. Esta coisa do tudo ou nada continua a ser, para mim, difícil de compreender e interiorizar. Agora tudo tem que ser para ontem, hoje em dia os afectos são quase que informáticos, a coragem está nas palavras que se escrevem e não nas atitudes que se tomam. Essa mesma coragem que se demonstra nas redes sociais não é transposta para a realidade, as pessoas refugiam-se atrás do ecrã do seu computador ou do
smartphone para, não raras vezes, proferirem impropérios ou ofensas que, cara a cara não conseguiriam nunca fazer. Aliás, já Umberto Eco dizia criticamente sobre as novas tecnologias que as redes sociais dão direito à palavra a uma “legião de imbecis”, o que é certo é que hoje toda a gente conjectura e tem uma opinião sobre tudo e mais alguma coisa. As pessoas deixaram de saber esperar, querem tudo no imediato… a exposição pública é de tal forma elevada que a privacidade quase que deixou de existir (nós também o permitimos, consciente ou inconscientemente, ao aceitarmos, concordarmos e ignorarmos as políticas de privacidade dos sites)… o sucesso é baseado no número de
likes, de amigos, seguidores ou leitores… a estatística serve para tudo… os telefones são inteligentes, têm aplicações que servem para tudo, servem, imagine-se, até para telefonar (aparentemente o menos importante nos dias em que vivemos). Reconheço que muitas das inovações têm revolucionado o nosso mundo. O campo da medicina é paradigmático nesse sentido e a evolução tem sido muito significativa. Sim, é verdade, as tecnologias quando utilizadas para o bem são, de facto, fantásticas e ajudam muito. No entanto o que tem que ser também considerada é a falência e a incapacidade para controlar e minimizar até, pelo menos, tornar residual a parte maléfica da tecnologia. Esse é o grande desafio mas também a grande dificuldade dos dias de hoje. Agora existem “
Youtubers”, os “
Youtubers” são pessoas que conseguem fazer vida (alguns) do número de visualizações das suas páginas ou vídeos publicados na
Internet. Muitos destes “
Youtubers” são denominados também de “
Influencers”, mais não são do que pessoas que publicam conteúdos sobre certos e determinados temas em que são ou se tornaram especialistas (muitos no absurdo!!) e conseguem ter milhões de visualizações e seguidores. Quando isso acontece são as próprias marcas com nome no mercado que se associam a essas pessoas tal não é a influência que existe sobre os tais seguidores. No fundo são uma espécie de influenciadores de decisões, de comportamentos e opiniões que com a valorização das suas próprias opiniões conseguem impor as suas ideias a outros.
De facto não me preocupa a forma como eles conseguem fazer daquilo vida, preocupa-me sim aquilo que é publicado e consumido pelos nossos jovens e adolescentes quando não existem quaisquer filtros que impeçam a visualização de conteúdos impróprios e inadequados às suas faixas etárias. Ainda que existam mil e uma aplicações de controlo parental, o que é certo é que há outras tantas que fazem o trabalho inverso.
A minha preocupação com isto das redes sociais tem vindo, de certa forma, a crescer. A propagação de notícias falsas, de boatos, a destruição de vidas, a difamação, a criação de falsos perfis com objectivos, no mínimo, estranhos, a proliferação dos mais diversos crimes informáticos, a desinformação e o seguidismo são o que mais me preocupa. Cada vez mais penso que a forma como concebo a utilização das redes sociais não se coaduna com os dias estranhos (muito estranhos!!) em que o mundo vive. Para mim as redes sociais servem para a diversão, para o sorriso, para o conhecimento, para a alegria, de forma a conseguir equilibradamente partilhar aquilo que quero com quem quero mas sempre “na desportiva”… isso de destilar veneno não é para mim. Dada a conjuntura actual do nosso mundo chego a pensar, com algum saudosismo é verdade, na inocência dos anos oitenta, sem internet, sem redes sociais de âmbito informático, sim porque as redes sociais da altura eram as da rua, do jogo da bola, dos amigos de infância. Será que não dá para voltar aos anos 80? Pois… não é possível! Aguentemo-nos, equilibradamente, com o que temos mas sempre sem que algo ou alguém nos subjugue a liberdade do pensamento e dos ideais e nos influencie no que quer que seja… Difícil, não é?