O terreno dava para construir 1200 campos de futebol, mas João Cortez de Lobão preferiu plantar 1,3 milhões de oliveiras. O bancário que se tornou agricultor é hoje responsável por quase 3% da produção nacional de azeite. Todas as azeitonas que transforma em ouro líquido na Herdade Maria da Guarda, em Pias, no Alentejo, têm como destino a exportação.
Dos dois milhões de quilos de azeite a granel que João produz todos os anos, 95% segue para Itália, onde é engarrafado e vendido para todo o mundo com o selo azul e amarelo da União Europeia.
“Os italianos são os maiores exportadores de azeite embalado do mundo, mas não têm azeite de qualidade em quantidades suficientes para fornecer todo o mercado”, explica Cortez de Lobão, que já perdeu a conta aos camiões transalpinos que todos os anos cruzam as fronteiras e “fazem fila à porta do lagar”. Um fenómeno que tem origem na própria natureza, já que o clima do Alentejo faz com que a primeira colheita de azeitona do Mediterrâneo seja feita em Portugal.

Ao azeite nacional, segundo o produtor, para ser
reconhecido a nível global, faltam-lhe os anos de marketing que Itália tem de sobra.
“Só Brasil e Angola é que reconhecem o azeite português como o melhor do mundo. A percepção dos outros países está virada para Itália, o que é natural. Eles têm canais de distribuição muito antigos, a comunidade italiana espalhada pelo mundo é enorme e há milhares de restaurantes italianos que só compram azeite que venha do país”.
O que os apreciadores de lasanha e carbonara não sabem é que o azeite que lhes chega ao prato tem sotaque alentejano. “Em Portugal ficamos com o melhor, que são as oito toneladas de oxigénio que as nossas árvores produzem”, brinca o produtor.
Cortez de Lobão acredita que o reconhecimento há-de chegar, mas sublinha que não basta um agricultor para plantar um olival. “Quem conhece o sector sabe que cerca de 70% do azeite produzido em Portugal é de primeira qualidade. Não há outro país com uma quantidade tão elevada. Mas tem de haver uma estratégia nacional para promover o produto. Não tenho dúvidas que em meados do século o azeite português será reconhecido como um dos melhores do mundo”.
Fora dos planos de Cortez de Lobão está a criação de uma marca própria, que já existiu mas acabou por ficar pelo caminho. “Verificámos que havia pouca margem. É um caminho que não nos entusiasma porque queremos ser rentáveis e a marca própria aumenta o risco de destruir valor, numa área onde a concorrência é muito forte e as margens são pequenas”, justifica o produtor.
A “joia da coroa” da família
A herdade, que chegou a ser nacionalizada depois do 25 de Abril, está na família Cortez de Lobão desde o século XVIII. Foi na passagem de testemunho entre gerações que João, não sendo o mais velho dos seis irmãos, optou por abandonar uma carreira na banca para se dedicar à agricultura.
Tinha uma situação óptima e vim endividar-me, mas o meu pai disse que se ninguém tomasse conta da terra vendia a propriedade
A construção da Barragem do Alqueva foi decisiva para a transformação da Herdade Maria da Guarda em olival. “Pareceu-nos a opção mais completa e rentável. Optámos por um modelo de negócio que passa por produzir em muita quantidade a um preço competitivo, vendendo a quem sabe distribuir nos canais internacionais”, explica Cortez de Lobão.
A forma como a matéria-prima é negociada no mercado foi só mais uma das muitas vantagens que o produtor viu no negócio do azeite. “Neste sector a entrega do azeite só se faz depois de recebido o dinheiro. O cliente só carrega o azeite depois de ter depositado o dinheiro na conta e o risco de cobrança desaparece. É uma vantagem que o sector do vinho não tem”, salienta o responsável da Herdade Maria da Guarda, que hoje não hesita em afirmar que trocar a alta finança pela agricultura foi a opção certa. Uma certeza que tal como o azeite, acabou por vir ao de cima.
c/ Ana Sanlez - Dinheiro Vivo